quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Carta a I. (a última)

Queria que soubesses que estou bem. Tal como o Noah em tempos disse a Allie, "Já não tenho ressentimentos, pois sei que o que tivemos foi real". Quis que esta carta fosse especial, pois nunca a lerás. Nunca te será entregue e nunca terás a possibilidade de a guardar, com desprezo, no fundo da tua gaveta onde se misturaria com todas as outras que te enviei, já esquecidas.
Tomei a derradeira decisão de te eliminar do meu pensamento. Por vezes é doloroso e dou por mim perdida nas nossas memórias e na semana que mudou a minha vida para sempre, mas finalmente encontrei o meu caminho. E o meu caminho, ao contrário do que diz a sabedoria popular, não vai dar a Roma.
Sei que seguiste com a tua vida, sei que estás bem. Também sei que chegará o dia em que não te lembrarás mais do meu nome, de onde venho, ou das promessas que fizemos. Eu, pelo contrário, sei nunca vir a atingir esse dia, pois a tua memória permanecerá para sempre guardada em mim.
De noite, quando o silêncio se instala no meu quarto e da janela observo as luzes da cidade à distância, não penso em ti. Quando me sento à beira do Tejo e acendo um cigarro pensativo, não sinto a tua falta. Se subo e desço as colinas de Lisboa, à procura de uma resposta às minhas perguntas, o teu nome não ecoa na minha mente. Deixei de viver em tua função, o meu coração finalmente pode descansar. Se por acaso o meu nome surgir por entre palavras, não te iludas, já não te pertenço.
Lembras-te da quantidade de vezes em que amaldiçoámos a distância que nos separava? É agora essa mesma distância que me conforta, que me dá força e vontade para seguir em frente. Como diz a Norah Jones, "Se nunca voltares, permanecerás uma memória distante"... Sei que nunca voltarás, a distância encarregar-se-á do resto. O tempo apagará a dor e limpará as lágrimas derramadas, transformando tudo isso em algo que nos fortificou perante a vida. Uma lição da qual retirámos um pequeno pedaço de esperança, agora já dissipada.
Sinto que ficou tanto por dizer, mas já não importa. Esqueci os teus beijos, esqueci o teu sorriso perante a minha presença, os teus olhos já não me assombram. Guardarei com carinho o que me deste, mas jamais lhes pegarei.
Já não te amo, recordo-te.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Nostalgia vs Melancolia

Penso que estou em casa, quando na verdade mal comecei a minha viagem. Estas ruas enchem-me de um desespero que tento passar para o papel. Chamam-lhe nostalgia, para mim não passa de melancolia. Sinto-me pequena ao pé destas fachadas imponentes, a música que paira no ar mistura-se com os meus pensamentos. Quanto tempo mais ficarei aqui? Numa cidade que me chama sua filha mas não me dá o amor por que anseio. Penso no que estará a faltar, medito. Sei a resposta mas engano-me numa teia de mentiras e negações que sei serem necessárias. Atrevo-me a dizer estas palavras...? Faltas tu. Do sitio onde me encontro vejo os raios de luz a sobreporem-se às fachadas altivas dos edifícios, já não sei quem sou sem as suas sombras que me acolhem. Essa luz penetra na sombra que me abraça, como uma promessa de que dias melhores virão. Levanto-me com uma mão a proteger os olhos e recolho-me na sombra mais próxima.

Perdida em Roma

Depois de um voo de apenas 30 minutos, tinha finalmente acordado para a realidade: Já não me encontrava a teu lado. Na minha mente tudo parecia um remoinho de ideias, no meu peito, de emoções. Vi-me sozinha naquela noite, numa cidade que me era tudo e não me era nada, que fora palco dos meus sonhos e desejos nunca concretizados. As horas passavam, os aviões lá fora partiam e chegavam e eu sentia-me fatigada, prestes a quebrar. Quando finalmente tomei conhecimento do que deveria fazer a partir dali, respirei de alivio, mas não fora por isso que me senti menos nervosa. Vi-me num autocarro escuro, que andava por entre estradas e mais estradas, o aeroporto cada vez mais longe, o centro da cidade a aproximar-se. Ao meu lado encontravam-se dois indivíduos, quem sabe na mesma situação que eu. O motorista tentava acalmar-me, apesar da barreira linguística que nos separava. Foi apenas quando abri a porta do quarto que me iria abrigar naquela noite que o meu coração decidiu também ele descansar. Lembro-me de me ter sentado naquela cama enorme, aquele silêncio ensurdecedor de hotel a zumbir nos meus ouvidos, e de me ter deixado deitar, fatigada. Lembro-me de ter pensado que, não havia 4 horas, estava ao teu lado. A pegar-te na mão. A beijar os teus lábios e as tuas lágrimas. Chorei, silenciosamente. Estendi o braço de forma a chegar ao meu maço de tabaco, aquele que tu me tinhas comprado, que tu tinhas escolhido para mim no dia anterior, quando ainda me pertencias realisticamente. Acendi um e vi o fumo a rodopiar em direcção ao nada, tal e qual os meus pensamentos. Sabia que o dia seguinte iria ser igualmente fatigante, portanto deitei-me, e foi a pensar em ti, a ouvir as nossas músicas, que adormeci. Acordei mal o sol nasceu e saí para o dia nublado. Estava frio e as minhas mãos geladas. Mal pareciam aquelas mesmas mãos que te tinham amado. De novo o mesmo autocarro, a mesma simpatia do motorista, o mesmo aeroporto. Uma devolução de bilhete, um avião que levantou voo, um choro escondido. Olho pela janela, e reconheço a imensa massa de metal vermelho, que se estende ao longo do Tejo. Lisboa. Portugal.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Lisboa

Lisboa, parte I
Perco-me nas ruas de Lisboa.
Não sinto o meu corpo, já não o habito. Com o frio cortante na minha face, caminho sem destino. Dou pequenas passadas, o meu coração bate desenfreadamente pois sabe que algo não está bem. Tenho lágrimas a escorrerem-me pela face mas não as limpo, as minhas mãos geladas procuram conforto nos meus bolsos.
Não sei para onde vou mas não paro, é noite e mal se distinguem as faces dos que por mim passam, alheios ao turbilhão de sentimentos que reside na minha alma. Acho que te procuro, nos edifícios que nunca visitaste, na calçada que nunca pisaste, onde estás tu? Não vês que preciso de ti? Estaco por um instante e penso no ridículo desta retórica. Já te foste embora, de um sitio onde nunca estiveste.
Continuo a andar, sinto agora os meus músculos doridos, a minha roupa ensopada pelas cobardes gotas de chuva que vagarosamente caem. Contorno uma esquina e vejo um eléctrico passar, provavelmente o último do dia. Perdi a noção do tempo, sinto que não importa. Estou a viver na minha mente.
E na minha mente tudo é diferente.

Lisboa, parte II
Caminho a largas passadas enquanto choro, isto não pode ser real.
Dez anos se passaram, dez anos duma vida que não foi vivida devido à tua ausência sufocante, mas tu regressaste, tal como eu sabia que o farias.
Agora quase corro, sinto o meu coração a implorar para que abrande, mas não consigo. Quanto tempo passou desde o teu telefonema? Trinta, quarenta minutos? Não sei, a mim parecem-me horas. Tinha acabado de chegar a casa do trabalho, cega pela rotina que tinha adoptado desde que saíste da minha vida. Pouso o meu casaco, dirijo-me à cozinha com o intuito de enganar a fome, o telefone toca. Atendo automaticamente, qual máquina em piloto automático. Bastou-me ouvir o meu nome em forma de interrogação e percebi que eras tu, ao que o meu corpo respondeu com um tremor descompassado e o meu coração estacou. Voltaste.
Encontro-me agora a correr pelo jardim dos Jerónimos, já avisto a Torre de Belém em toda a sua magnificência e corro ainda mais rápido, sem dar importância aos turistas que por ali passavam e me olhavam com uma expressão interrogativa na cara. Finalmente chego à zona ribeirinha onde o Tejo se move em paz, como que se o seu propósito tivesse finalmente chegado. Abrando o passo e olho em frente, na direcção da Torre, sentada à beira do rio encontra-se uma única pessoa. Aproximo-me e ela ouve os meus passos, virando-se para me encarar e levantando-se de seguida.
Tenho lágrimas a escorrerem-me pela face, até ao pescoço. Está escuro, mas reconheceria essas tuas expressões a quilómetros de distância, embora mudadas. Já não és a adolescente frágil que conheci no Verão de 2008, agora és uma mulher.
Ficamos imóveis durante o que me parecem horas, a contemplar-mo-nos mutuamente. Até que te aproximas e me pegas na mão. Passas os teus dedos suavemente pelos meus, tal como fizeste na noite antes de me despedir de Itália, do nosso quarto de hotel, de ti. Agora vejo lágrimas nos teus doces olhos. Cuidadosamente, encaixas o teu corpo no meu e ao meu ouvido murmuras num português perfeito, "Eu nunca te esqueci". Como uma última peça que faltava para terminar um puzzle, fecho os meus braços à tua volta e respondo, enquanto sinto aquele teu aroma que me atormentou infinitas noites, "Neanche io".

Lisboa, parte III
Volto a mim, e a minha mente volta-se a fundir com o meu corpo.
Chove agora torrencialmente, mas mantenho as pequenas passadas pela calçada de Lisboa. Dez anos passaram e o único sitio onde continuas presente é na minha mente, nunca voltaste.
Recolho-me então por baixo de um alpendre, onde limpo as minhas lágrimas. Ponho o meu capuz e dirijo-me para o conforto da minha casa, onde o silêncio é ensurdecedor.
Nunca voltaste, porque nunca cá estiveste.