sábado, 28 de agosto de 2010

"Há palavras que nos beijam"

Sou um ser raro. Um ser cuja existência e propósito eu própria desconheço. Nisto, perguntam-se: "Mas não o somos todos?". Sim, embora o sejamos de formas distintas. E aquilo que nos distingue neste aspecto tão, à partida, comum, é a razão que nos levou a chegar a tal conclusão.
Mais uma noite, mais uma vaga de pensamentos que insistem em não me conceder paz de espírito. Preparo-me para terminar mais um dia, fechar os olhos e render-me à paz que o sono sempre nos concede, quando sou assomada por uma série de questões. Porque sinto eu esta urgência de passar para palavras aquilo que sinto? Porque procuro eu, exaustivamente, os adjectivos caracterizadores do meu estado de alma; os substantivos que, com estes últimos combinados, construam uma imagem mental da turbulência residente no meu espírito; os pontos interrogatórios que me façam cogitar de forma a embrenhar-me na minha própria solidão e os pontos finais que arduamente tentem concluir de vez um assunto? Na música, toda a minha atenção se concentra no que nela é dito, ignorando cada acorde instrumental que, sem sucesso, me tenta libertar de um estado de melancolia permanente.
Não me contentando com as palavras que do meu âmago fluem, quais sentimentos, procuro as de outrem, alimentado-me naquelas com que me identifico, tal e qual uma droga. Sinto-me dependente delas, retiro prazer do significado que cada uma desperta em mim. "É a solidão que inspira os poetas, cria os artistas e anima o génio", disse em tempos Henri Lacordaire. A este senhor, apenas uma coisa tenho a dizer: Obrigada. Agradeço por, mais uma vez, me aliviar deste estado sôfrego de dependência, tal como todos os dias fazem outros autores, pensadores, filósofos.
Voltei a mergulhar no meu subconsciente, na minha solidão. A minha mão treme enquanto desenho cada uma destas palavras; a caneta é a minha seringa; a tinta, a droga que me alivia a cada dose. Não sou um Pessoa, uma Florbela ou um Larkin, nem nunca na vida almejarei possuir o génio destes senhores. Porém, de uma coisa tenho a certeza: Neste momento sei ser superior a eles, pois não há droga que me alimente mais, do que a destas palavras.

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